Setenta e seis escolas estaduais de Mato Grosso devem passar a ser administradas por empresas privadas. A partir da publicação do edital de "Procedimento de Manifestação de Interesse" no mês passado, uma empresa de Minas Gerais manifestou interesse em elaborar um projeto para definir detalhes da parceria com uma empresa privada para a construção, reforma, ampliação, gestão, manutenção e operacionalização de serviços não pedagógicos dessas escolas e de 15 Centros de Formação e Aperfeiçoamento Profissional (Cefapros).
A empresa foi contratada e, em 120 dias, deverá apresentar um projeto ao estado. Com base nisso, vai ser aberto um processo licitatório para a escolha de uma empresa interessada em assumir o serviço. A vencedora irá comprar esse projeto.
Para o Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Público de Mato Grosso (Sintep), o processo tem caráter "privatizante" e fere a legislação nacional e estadual.
O processo de contratação é feito pela Secretaria Estadual de Educação (Seduc), que, neste mês, foi alvo da Operação Rêmora, do Grupo de Atuação e Combate ao Crime Organizado (Gaeco), e pela MT Participações e Projetos S/A. Podem concorrer pessoas físicas, jurídicas ou consórcio.
O presidente da MT PAR, Vinícius de Carvalho Araújo, afirmou que o estado optou pela Parceria Público Privada (PPP) para receber investimentos do setor privado. "Podemos ampliar e melhorar as escolas em dois anos e poder pagar o valor num prazo mais longo de até 25 anos", afirmou. Segundo ele, a empresa vencedora deve entregar 31 novos prédios em dois anos, a partir do fechamento do contrato.
"O estado vem pagando aluguel e esse é um dinheiro que não volta . Agora, o estado vai comprar novas unidades", argumentou. Ao todo, são 45 escolas funcionando em prédios alugados.
Pelos serviços de manutenção e reforma, a empresa privada deve começar a receber de imediato. Já pelas obras de construção, somente quando entregar o serviço. O projeto inclui 10% da rede estadual. "É um teste, um experimento. Se a experiência for positiva, o governo pode expandir para o restante da rede", disse o presidente da autarquia.
As unidades escolares selecionadas para ser transferidas para o setor privado estão localizadas em 27 municípios. Conforme o estado, existe a intenção de abrir aproximadamente 40 mil novas vagas.
Mato Grosso tem 755 unidades de ensino, duas creches, 23 Centros de Educação de Jovens e Adultos (Ceja); 69 unidades escolares indígenas, cinco Unidades Escolares Quilombolas, cinco Unidades Escolares de Educação Especial, 142 Unidades Escolares de Educação do Campo, 498 Unidades Escolares Urbanas e 11 Unidades Escolares Confessionais.
O argumento usado pelo governo para a terceirização do serviço é melhorar a estrutura das unidades. "O estado de Mato Grosso, assim como muitos entes da nossa federação, padece de condições mínimas de estrutura física para a maioria das escolas, tendo como consequência imediata o significativo agravamento do ambiente escolar", diz o edital.
Alega ainda que "as instalações físicas exigem ampla necessidade de reformas, ampliações e melhorias". Diz que, com a contratação de empresas privadas, irá investir no setor. "Assim como existem algumas unidades escolares que foram locadas o que torna sua manutenção ainda mais onerosa. Existe a necessidade de substituição dessas unidades por construções com concepções modernas, tornando o ambiente agradável e acolhedor".
O vencedor do processo deve ter as seguintes atribuições: a estruturação e controle administrativo de cada unidade; custeio das despesas de água, energia, telefone, gás, taxas e tributos (imóvel e serviços), internet (wireless); investimento em todas as unidades escolares de mobiliário; equipamentos (utensílios, informática, segurança, catracas, dentre outros); serviços de limpeza e jardinagem; serviços de conservação e manutenção predial geral; serviços de vigilância e portaria; alimentação escolar (merenda) somente nas 31 escolas que serão construídas; transporte em duas unidades escolares especificas; fornecimento de materiais, reprografia e impressão; fornecimento de material de uso contínuo, material de consumo de escritório, materiais de conservação e limpeza, e insumos de informática; insumo humano para atender todo o modelo de gestão dos serviços não pedagógicos acima definidos, bem como outros serviços que o estado julgar pertinente no âmbito não pedagógico. É o que consta no edital.
Pontos negativos
O presidente do Sintep-MT, Henrique Lopes, listou alguns pontos negativos do projeto, que, segundo ele, infringem as leis estadual 50 de 1998, que regulamenta a carreira dos profissionais da educação, e a 12.014 de 2009, que fez uma alteração no Artigo 61 e reconheceu os servidores que trabalham na parte de limpeza, merenda e vigilância como profissionais da educação.
"Historicamente, defendemos a escola pública. Alguns projetos chegam para a sociedade sem revelar a intenção e causa confusão. Por que Mato Grosso, um dos estados mais ricos da federação, não tem condições de construir escolas? Porque a riqueza do estado está sendo canalizada para uma pequena parcela da sociedade", avaliou o sindicalista.
Ele pontuou, no entanto, que o sindicato não é contra todos os pontos do projeto, mas alguns, segundo ele, não podem ser aplicados no setor público. "Nós somos contra a concessão de serviços públicos para a iniciativa privada, até porque o público e o privado já fazem parcerias e a própria operação [Rêmora] mostra que as relações com o público e o privado nem sempre atendem aos interesses públicos", declarou Lopes, se referindo às irregularidades em contratos firmados pela Seduc com empresas para a construção e reformas de escolas. Os crimes vieram à tona durante a operação.